quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Pobrezinha


Dona Lorena era a pior fofoqueira da rua. Incapaz de um sorriso sincero, tudo na sua vida era baseado no interesse que remetia o que podia ser melhor para si. Assim convivia com os vizinhos semeando discórdias, rainha das intrigas. Ninguém sabia sua idade, por baixo devia ter uns cinquenta anos de bairro, lugar que foi casada e hoje se encontrava viúva. O que se sabia era que desde sua existência ambiente nunca mais foi o mesmo.

O falecido, o querido Seu Rufino, era boa praça, uma gentileza com o próximo que ninguém entendia como vivia sobre o mesmo teto que tamanha surucucu. Quando partiu, cedo na casa dos sessenta, conspiraram que foi envenenado pela megera, um gozador disse que morreu para se livrar da danada, mas na verdade sofreu infarto do miocárdio. Passado o velório tinha quem apostasse que a viuvez traria um pouco de humildade naquela carranca, e foi nesse momento que a bruxa apareceu.

O rancor da solidão fez surgir uma fera perigosa capaz de expulsar o filho de casa e colocar vidro em bife para matar cachorro de vizinho. A peste era danada, quanto mais grisalha, mais maléfica. Uma nuvem negra que sobrevoava aquele sobrado que parecia um castelo de filme de terror.

Quando todos já imaginavam a desgramada como eterna, caiu doente. Ficou um trapo, caquética e desmemoriada. Uma figurinha tão frágil, que em nada recordava o tsunami de atrocidades. Sua família que essa altura já tinha ido cada qual para um lado providenciou uma ajudante para acompanhar seus últimos anos sem envolvimento afetivo. E assim, abandonada limitou seus dias em caminhadas pelas calçadas nas manhãs de sol. Irreconhecível, apoiada na enfermeira e sem qualquer sinal de sanidade mental, ria abobada para quem passava na alameda quando um garotinho que atravessava a rua cutucou a mãe.

-olha ali que vovó boazinha!